Festa Junina de Escolas...
Festa junina de escola é mais que a dança da quadrilha, dizem
educadores
Arte UOL
Junho é o
mês da quadrilha nas escolas brasileiras. Aliás, não só dela, como também da
roupa xadrez, das comidas típicas, dos bigodinhos desenhados com lápis e das
trancinhas falsas nos cabelos das meninas. Mas será que tudo isso tem relação
com a festa junina de verdade?
Bem, mais
ou menos. Segundo três especialistas ouvidos pelo UOL, há um exagero no "caipirismo". Além disso, diversos
elementos da festa acabaram sendo esquecidos na maioria das escolas
brasileiras.
Segundo
Jadir de Morais Pessoa, professor da Faculdade de Educação da UFG
(Universidade Federal de Goiás), as escolas reduziram a festa junina à
quadrilha. Não que a música não seja importante, mas há muito mais a se
explorar.
"Componentes
simbólicos, como o fogo, o mastro, a evocação do espírito da fertilidade não
aparecem nas festas. Além disso, o que é enfatizado na quadrilha são seus
aspectos grotescos. Há um exagero em roupas rasgadas, remendadas e em
trejeitos, explorando-se o caipirismo desdenhosamente,
preconceituosamente", afirma Pessoa.
"Os
tipos sociais rurais apresentados pararam no tempo. Não ultrapassaram o
personagem de Monteiro Lobato, o Jeca Tatu das primeiras décadas do século
20", completa Pessoa.
Talvez a
melhor maneira de deixar os estereótipos de lado seja focar a celebração na
colheita. Isso porque a festa, apesar do cunho religioso - a celebração dos
dias de Santo Antônio (dia 13), São João (24) e São Pedro (29) - também tem sua
origem relacionada à colheita. Para
Betania Libanio Dantas de Araujo, professora do Departamento de Educação da
Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), a festa junina pode ser importante
nas escolas para fazer o aluno "vivenciar momentos de solidariedade e
construção coletiva"."A
festa é o momento no qual os camponeses comemoram coletivamente a colheita e
trabalham em toda a sua organização artística e cultural com uma estética
própria e diferenciada. Por isso, ela deve ser um projeto da escola e ter todos
os professores envolvidos neste projeto para que de fato seja uma festa tão
coletiva quanto nos sertões nordestinos, por exemplo, cujas famílias recebem os
festeiros com fartos banquetes", explica Libanio.
Dentro
desse espírito, analisa Betânia, é possível resgatar vários símbolos que já
foram esquecidos, acolher as ideias das famílias e reconhecer, a partir da
própria história da comunidade escolar, as heranças culturais presentes e que
podem ser resgatadas e valorizadas -- o que, para ela, também estabelece
aproximações e vínculos entre novas práticas culturais.
"Várias
simbolizações entre os camponeses já não são conhecidas entre os urbanos como:
comadre e compadre de fogueira, quebra pote, quadrilha tradicional, teatro do
casamento caipira, produção artesanal dos alimentos para a festa. Algumas
dessas práticas podem ser vivenciadas pelos estudantes e professores",
afirma.
Conheça 9 curiosidades sobre a Festa Junina
A
tradicional Festa Junina é o segundo maior evento festivo do Brasil. Comidas,
bebidas e brincadeiras típicas fazem a alegria dos participantes. As festas
acontecem em junho e homenageiam três santos: Santo Antônio, no dia 13; São
João, 24; e São Pedro, no dia 29 de junho. Confira a seguir 9 curiosidades
sobre a celebração Imagem: Arte UOL
O
professor Jadir de Morais Pessoa concorda que há elementos pouco ou nada
explorados nas festas juninas celebradas pelos colégios Brasil afora.
"Ao invés de se fixar quase que exclusivamente no caipirismo, a escola poderia abrir
um pouco mais o seu foco e alcançar os demais aspectos da festa, como o
fenômeno do solstício, ancestralmente constitutivo desse ciclo festivo, as
comidas típicas regionais simbolizando as primícias da colheita e buscando
imprimir na consciência juvenil novos parâmetros para a relação campo e cidade,
que não esse caipirismo, que só visa reproduzir o preconceito contra o homem
rural", diz.
É curioso
perceber que, além dos santos, a festa junina é costumeiramente celebrada no
fim do mês de junho por causa do solstício de verão. Isso porque, no hemisfério
norte, onde a festa tem sua origem, o solstício de verão ocorre entre os dias
20 ou 21 de junho. Segundo o professor Pessoa, é "o dia em que o sol
está mais no centro do céu, também conhecido como dia mais longo do ano".
Festa laica ou religiosa?
Uma das
principais questões levantadas hoje em dia sobre a festa junina nas escolas é
sobre o seu caráter religioso. Não raro, algumas famílias católicas não
permitem que seus filhos participem das festividades justamente por serem
consideradas homenagens a Santo Antônio, São João e São Pedro.
Para a
pedagoga Tânia Finkelmann Landau, é possível celebrar a festa junina sem ferir
os preceitos de um ensino laico e trazendo famílias de diferentes tradições
religiosas para a celebração.
"A
festa junina é uma celebração da cultura popular brasileira. Ela tem sim um
aspecto marcado pela religiosidade, mas podemos explorar outros elementos como
a dança e o cancioneiro. Mesmo a parte religiosa pode ser abordada dentro da
escola como uma questão do respeito à diversidade", afirma.
Segundo a
professora Betania Libanio Dantas de Araujo, é possível apreciar a arte de
Michelangelo e Botticelli, intimamente ligados à religião, mesmo não sendo
cristão. O mesmo princípio vale para a festa junina.
"Existem
escolas em que todos querem participar, inclusive estudantes de diversas
religiões. O importante é que o estudante não seja impedido de conhecer a sua
cultura e poder simbolizar. O conhecimento da cultura não pode ser negado à
todos e quanto às festas, os estudantes devem ter liberdade de participar ou
não participar por escolha pessoal. A escola pode pensar em diversas ações que
possam privilegiar a confraternização e as ações coletivas pouco fomentadas na
cidade", diz.
Na visão
do professor Jadir de Morais Pessoa, é possível suprimir da festa junina a
parte da religiosidade e celebrar a parte folclórica não-religiosa.
"Com
esses componentes [não-religiosos], não faz nenhum sentido as famílias de
outros credos impedirem seus filhos de participarem da festa junina da escola.
Esse impedimento equivaleria a impedir que seus filhos sejam brasileiros. É uma
questão de a escola deixar claro que seu projeto pedagógico objetiva formar o
jovem conhecedor da cultura popular brasileira e que isso não tem,
necessariamente, uma distinção confessional", afirma.
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